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Ritalina realmente melhora o desempenho acadêmico?

                         Época de provas, não estudei nada ainda, preciso ficar acordado, preciso me concentrar. Meu celular não para, whatsapp, facebook, TV. Como faço pra me concentrar? Já sei, um amigo está usando ritalina, disse que conseguiu revisar toda a matéria de madrugada. Vou tomar também.


A cena descrita acima é cada vez mais comum, principalmente no meio acadêmico ou dos chamados concurseiros, que precisam estudar muito todos os dias.
Um grande número de estudantes vêm utilizando psicoestimulantes, cujo representante mais conhecido é a Ritalina®, para aumentar sua capacidade cognitiva.
Ritalina® é receitada sobretudo para o tratamento do Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH). No Brasil, é prescrita em receituários de cor amarela (A), destinados às substâncias com evidente potencial de abuso.  Seu mecanismo de ação resulta no aumento da concentração de dopamina no cérebro, mecanismo parecido com o de drogas como a cocaína. Tal associação de efeito predispõe os usuários de Ritalina® ao abuso de drogas ilícitas.
Por conta da pressão social para o desempenho, os médicos têm sido tolerantes ou até coniventes com a prática da prescrição indiscriminada, desconsiderando os riscos associados.
Os maiores usuários de psicoestimulantes são estudantes mais graduados, estudantes que se submetem a um elevado estresse ou aqueles que já fizeram uso de drogas ilícitas. Uma revisão da literatura médica mostrou que cerca de 15% dos estudantes de medicina usam Ritalina® para melhorar o desempenho acadêmico, embora não haja evidências consistentes de que possa melhorar o aprendizado de estudantes saudáveis.  
Um estudo bem controlado por placebo demonstrou que pacientes saudáveis que eram submetidos à privação do sono e que usavam uma dose de Ritalina® no dia seguinte não tinham desempenho superior aos que usavam placebo em testes de memorização, que foram realizados em dias posteriores.
O uso inadequado de psicoestimulantes está associado ao agravamento de transtornos psiquiátricos pré-existentes, como o transtorno do pânico e o transtorno bipolar, ao aparecimento de sintomas psicóticos, infarto e até mesmo a morte súbita.
O reconhecimento de que o TDAH persiste em pacientes adultos, levou a uma maior prescrição de medicamentos psicoestimulantes nesse público, o que paralelamente, os estudos comprovam, aumentou o uso de psicoestimulantes sem prescrição médica em estudantes universitários. A mídia tem sido tendenciosa em fortalecer a ideia das “drogas inteligentes”, sem dar a devida relevância aos riscos associados ao uso indevido. Intuitivamente, parece lógico que drogas que melhoram a atenção e a concentração também devem promover a aprendizagem e o desempenho acadêmico, o que é um fato inegável nos pacientes que realmente sofrem de TDAH, mas que ainda não é verdadeiro para os que não apresentam o transtorno. Isso leva inclusive estudantes a simularem supostos sintomas de TDAH a fim de obterem prescrições legalmente. Como não fica claro se a medicação psicoestimulante tem efeito benéfico em pacientes saudáveis, é possível que muitos efeitos não passem de placebo. O que se conclui, na realidade, é que os psicoestimulantes, nas pessoas com bom nível intelectual, não ajudam a aumentar suas habilidades e que os rumores sobre as maravilhas das “drogas inteligentes” podem, na realidade, constituir uma falsa promessa com potenciais riscos à saúde.

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